domingo, 11 de outubro de 2009

(crescendo)

Você diz que todo diabo é sério, e mete medo no meu dentro, e isso me apavora. Sempre pediu pra eu sair pra rua enquanto encarava suas mágoas, e eu ia feito burro em dia de lavra, pensando por que cargas d’água me metia nesse futum teu. É, eu não sou de sair, não, quando pedem. Acho que sou mais de querer ficar, mesmo que seja pra ver a casa incendiar, porque daí ao menos estou mais perto, pra sei lá, de repente, ajudar. Sabe do que falo? O senhor ta sempre morinbundo, cansado da vida, do circo todo, e eu me indago o porquê disso; vai me dizer não? Dá uma vontade insana de descobrir o paradeiro que te habita, olhar de frente nos zói do bicho que fica grudado em ti. Só não sei por que não me deixa... mas que coisa! Já falei-lhe do que sou, parece não ouvir – será que pode isso? Contei que sou leal mais que muito, e que era pra tudo que eu estaria do teu lado, em caso que deixasse. Ora, senhor, não to pedindo nada, não. Fica achando que todo mundo é igual? Que eu vim pra te roubar as calças e sair só com o pão? Mas que me magoa essa história de me deixar de fora, nunca conta nada, ah, isso é feio, sim. É feio porque eu pedi pra me permitir olhar a vida inteira, e olha que nem pedi lugar – só que não me matasse no coração – mas o senhor tem sido muito mal. É, é sim. Um dia desses aí atrás, falou pra eu ir dar uma volta pra deixar mais ar pro senhor respirar, e eu fui, né, boa obediente que sou. Mas ora! Deixaste depois, a porta trancafiada! E ainda to na solera, sentada com as orelha grudada tentando ouvir som que sai daí de dentro – e o senhor não tem falado. O senhor tem me machucado, tens, será, noção disso? Pedi mesmo que falasse sem medo, e nem esse gosto pode me dar – oras, que fiz eu um dia pra agüentar isso? Que pecado acabei cometendo pra merecer agora esse peso de ter dona mesmo sem ele saber? Ah, eu me pergunto já há tanto tempo, nem sem mais onde me perder... vai, senhor, vo esperar mais ainda, como sempre – e até que dá certo. Enquanto to aqui fora, sem que me deixe entrar na nossa casa – vai dizer que não sabe que eu sou também tu? – fico passando o olho nos outro que passa correndo, pulando, dançando, ferindo, alegrando; e me distraio assim, comendo das alegriazinhas que a vida tem me oferecido de bom grado. Puxa vida, como pode isso? Logo o que tão doce era, vira bem amargo, e arranca parece o fígado da gente. Pode ser não, como será? Que beleza tão infinita tenha que ter muita agonia misturada junto no meio. Mas é coisa minha, quem vai dizer? Vai que é sina, ficar próxima, muito próxima, mas de verdade, no íntimo mesmo, de vez em quando só. Mas poder ver, pelo menos, daí isso é bom. Não, não, poder tocar, que é o que eu posso – ás vezes! Mas tocar com os dedo, a pele que sente tudo bem no fundo. Bonito sim, é sincero. Presente, sorte, qualquer nome que tenha: graça, talvez? De estar lado a lado do genuíno, vez ou outra. Encontra, encanta, sorri. Ta bom, eu já sei: tu ainda não vê, né? Mas eu vejo por nós dois, e daqui a pouco eu sei que vais ver junto.

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